Da irrevogabilidade de ser.
Ela não sabe o que fazer. Por onde começar. Por onde terminar.
Não mais existem certezas. Nem mesmo quanto ao uso pronominal. Seria na primeira ou na terceira pessoa do singular?
Não existem certezas, somente sensações desagradáveis, cobertas de bolor e a exalar um odor que irrita suas narinas. As mucosas nasais avermelhadas e a corisa que teima em escorrer buço abaixo indicam a inevitável alergia àquilo que lhe é peculiar e íntimo desde o todo sempre.
E haveria como afastar-se de si mesma nesse momento?
Porque é tão urgente e necessário que se torne concreto algo que é fisicamente impossível. E o terrível é a não supresa da afirmação, porque esse sempre foi o objetivo maior e último: o fisicamente impossível. O fisicamente impossível que é composto de sonhos, e impreterivelmente banhado a lágrimas azeitadas.
Tudo retorna àquilo que é essência e essa é a maior dor que alguém como ela pode carregar. Porque sua essência não é normal. Da sua essência brotam palavras extremamente sonoras e agradáveis aos ouvidos alheios, palavras que exteriorizam sua doença e sua dor, a qual é recebida com honras entusiásticas e clamorosas por uma platéia ávida por antinomias, distúrbios psicológicos e sangue expelido a olhos nus. Mas ela definha a olhos vistos em meio a críticas elogiosas e um público que ao final de uma hora e meia retorna ao conforto de suas casas e suas vidas práticas e meticulosamente alinhadas.
Ela permanece só.
E o que a dilacera é o fato de que não há como afastar-se de si. Não há, por mais tentativas, remédios, ajuda e paciência que lhe foram dados ao longo dos anos, como ser bem sucedida quando aquilo de que é feita é por si só podre e infecto-contagioso.
Não existe cura.
Houve um dia muitos sorrisos, racionalizações e tentativas sinceras de ser algo diverso de si mesma, mas a falha em ser outra é recorrente e eterna. Não há escapatória e é no momento da confirmação fática do que foi afirmado que jaz a sua esperança.
Por isso a saudade das paredes negras e a fumaça de glicerina que lhe penetrava nariz adentro, preenchendo-a de algo que a nutriu durante muito tempo. Porque por pior que fôsse, e por mais doente que sempre estêve, havia juventude, imaturidade e a ineficaz esperança de que mudanças eram possíveis e o ser humano poderia lhe entreter e compreender, quem sabe?.
Eu anseio pelas lágrimas de uma época distante, porque na minha crença de que havia possibilidade era viável encontrar algum motivo para manter a respiração contínua.
Como escapar a si própria?
Nessa questão e nos sutis contornos que revelam a sua absoluta incoerência e ineficácia é que residem as suas eternas angústia e miséria.
Vogler abandonou o recinto.
Deixou apenas um par de tesouras e um pescoço retesado em arrepio e vulnerabilidade.
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As paredes foram reconstruídas, o espaço foi alterado, as pessoas substituídas e quase tudo que lhe remetia ao passado foi indiscriminadamente censurado. Mudou-se o contexto e o ambiente. Mudou-se até mesmo o tempo. Mas é na inefetividade da tentativa de alterar-se que reside o desespero de ser si mesma.
Não mais existem certezas. Nem mesmo quanto ao uso pronominal. Seria na primeira ou na terceira pessoa do singular?
Não existem certezas, somente sensações desagradáveis, cobertas de bolor e a exalar um odor que irrita suas narinas. As mucosas nasais avermelhadas e a corisa que teima em escorrer buço abaixo indicam a inevitável alergia àquilo que lhe é peculiar e íntimo desde o todo sempre.
E haveria como afastar-se de si mesma nesse momento?
Porque é tão urgente e necessário que se torne concreto algo que é fisicamente impossível. E o terrível é a não supresa da afirmação, porque esse sempre foi o objetivo maior e último: o fisicamente impossível. O fisicamente impossível que é composto de sonhos, e impreterivelmente banhado a lágrimas azeitadas.
Tudo retorna àquilo que é essência e essa é a maior dor que alguém como ela pode carregar. Porque sua essência não é normal. Da sua essência brotam palavras extremamente sonoras e agradáveis aos ouvidos alheios, palavras que exteriorizam sua doença e sua dor, a qual é recebida com honras entusiásticas e clamorosas por uma platéia ávida por antinomias, distúrbios psicológicos e sangue expelido a olhos nus. Mas ela definha a olhos vistos em meio a críticas elogiosas e um público que ao final de uma hora e meia retorna ao conforto de suas casas e suas vidas práticas e meticulosamente alinhadas.
Ela permanece só.
E o que a dilacera é o fato de que não há como afastar-se de si. Não há, por mais tentativas, remédios, ajuda e paciência que lhe foram dados ao longo dos anos, como ser bem sucedida quando aquilo de que é feita é por si só podre e infecto-contagioso.
Não existe cura.
Houve um dia muitos sorrisos, racionalizações e tentativas sinceras de ser algo diverso de si mesma, mas a falha em ser outra é recorrente e eterna. Não há escapatória e é no momento da confirmação fática do que foi afirmado que jaz a sua esperança.
Por isso a saudade das paredes negras e a fumaça de glicerina que lhe penetrava nariz adentro, preenchendo-a de algo que a nutriu durante muito tempo. Porque por pior que fôsse, e por mais doente que sempre estêve, havia juventude, imaturidade e a ineficaz esperança de que mudanças eram possíveis e o ser humano poderia lhe entreter e compreender, quem sabe?.
Eu anseio pelas lágrimas de uma época distante, porque na minha crença de que havia possibilidade era viável encontrar algum motivo para manter a respiração contínua.
Como escapar a si própria?
Nessa questão e nos sutis contornos que revelam a sua absoluta incoerência e ineficácia é que residem as suas eternas angústia e miséria.
Vogler abandonou o recinto.
Deixou apenas um par de tesouras e um pescoço retesado em arrepio e vulnerabilidade.
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As paredes foram reconstruídas, o espaço foi alterado, as pessoas substituídas e quase tudo que lhe remetia ao passado foi indiscriminadamente censurado. Mudou-se o contexto e o ambiente. Mudou-se até mesmo o tempo. Mas é na inefetividade da tentativa de alterar-se que reside o desespero de ser si mesma.
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